No
lV Congresso Português de Sociologia, realizado em Coimbra, no ano de
2000, o sociólogo Manuel Villaverde, apresentou na sessão sobre: “
Democracia e Esfera Publica”, tese que abordava o medo que a população
portuguesa mostra perante os governantes.
O receio, tolhe, em muitos cidadãos o direito, e até o dever, de cidadania.
Poucos se aventuram assinar uma petição, opinar em recinto público, e terem pareceres sobre os mais diversos temas.
Se assim era no início do século, o mesmo receio mantém-se atualmente.
Há
quem queira responsabilizar Salazar e o Estado Novo, por essa postura,
lembrando que quarenta anos, sem democracia plena, gerou o medo de
intervir e contestar, seja o que for.
Porém
conheci quem viveu na 1ª Republica e se inibisse, por isso, de tomar
decisões. Tinham medo até de serem cristãos, lembrando-se dos crentes
que foram selvaticamente agredidos, quando oravam na igreja dos
Congregados, no Porto. Recordavam-se da conferência do Dr. António
Granjo, em que este teve que fugir, depois da Carbonária ter espancado a
assistência; e da destruição dos jornais: “ A Ressurreição”, “ Diário
do Porto”, “Jornal de Notícias”,” O Liberal”, “ O Correio da Manhã”, “ “
Diário Ilustrado”, “ “ A Palavra”, entre outros.
Esses
velhos, que conheci, contavam que era melhor ficar em silêncio. Porque,
como diz, António Manuel Pereira em “ Do Marquês de Pombal ao Dr.
Salazar” - Edição de Manuel Barreira: “ Se alguém pretendia reagir, era
certo e sabido que, poucos depois, sentia dolorosamente a prostituição
da “ Fraternidade”, através de uns “ beijos de Mãe”,
repenicados nas costelas, a golpes de cavalo-marinho, de que andavam
permanentemente munidos os filiados na famosa quadrilha conhecida por “Formiga-branca”, filha direta de outra não menos perigosa a “Carbonária”.
Como
se vê, a democracia, sempre andou arreada da nossa sociedade; mesmo em
tempos de monarquia. Na época dos liberais confundiu-se com bandalheira,
e no absolutismo, nem é bom recordar.
Por isso, é natural que o cidadão tenha medo, e se refugie no anonimato.
Fora
os ambiciosos, os que buscam lugares cimeiros, e vendem, quantas vezes,
a alma a troco de punhado de oiro, o cidadão honesto, foge da política e
receia defender seja o que for. Foi assim no Estado Novo e assim é na
3ª República.
Na
política como no desporto, não deve haver inimigos. Todos têm o
alienável direito de expor pareceres publicamente. Mas tem a obrigação
de ouvir e respeitar a opinião alheia, mesmo que discorde completamente.
Se
inibirmos o jornalista, o professor, o intelectual, de escrever o que
pensa, receoso de ser desfeiteado na praça pública ou insultado na
Internet, estamos a comportarmo-nos como o pior dos ditadores. Eu sei,
que muitos democratas, não passam de temíveis tiranos camuflados em pele
de cordeiro.
Ao
ameaçarmos o jornalista com o tribunal ou ao usarmos grupo de pressão,
para que seja despedido, estamos a ser pior que o mais severo censor.
Vilarandelo
de Morais era diretor de semanário gaiense. Certa ocasião disse-me que
tinha mais receio da justiça, do que da antiga censura. Porque esta
usava o lápis azul, e em regra, nada mais acontecia. Atualmente ser
responsável por periódico é andar com o credo na boca, no receio de ser
levado ao juiz e condenado a indemnizar o que o jornal não tem, nem pode
pagar.
Por isso, só mass-media, apoiada por fortes grupos económicos, é que se pode dar ao luxo de relatar a verdade nua e crua.
Esta
crónica já vai longa, e o espaço escasseia. Apenas quero lembrar que
não é democrático o parlamento, em que se insulta, ofende e insinua-se
maldosamente. É que os brados apagam o diálogo construtivo, próprio de
gente civilizada.
Pode-se
discordar, pode-se apontar erros, pode-se criticar, mas quando se cai
no insulto, no ultraje, estamos a destruir o que existe de melhor na
política: que é o respeito, o direito de todos poderem expor ideias,
livres de qualquer censura.
E
os parlamentares que esquecem as elementares regras de civilidade,
estão a transmitir, à sociedade, imagens de violência e degradação, que
forçosamente refletem-se na vida quotidiana de cada um.
HUMBERTO PINHO DA SILVA - Porto, Portugal
publicado por solpaz às 11:01
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